Pe. Paulo Sérgio Silva - Diocese de Crato - CE.
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este 18º Domingo
do Tempo Comum, nosso momento formativo que visa nos tornar discípulos
missionários de Jesus e anunciadores do Reino de Deus, traz-nos uma reflexão
sobre nossa atitude ante o apego demasiado aos bens materiais. Somos advertidos
para não centralizar nossa existência ou condicionarmos nossa felicidade a
posse de bens materiais ou no domínio de pessoas. O Reino de Deus nos convida a
descobrir seus valores que podem nos ajudar a encontrar o sentido de nossa vida
e a felicidade em plenitude.
Na
primeira leitura (Ecl 1,2; 2,21-23), o autor do Livro do Eclesiastes nos
indaga sobre qual o sentido de uma vida voltada para o acúmulo de bens. Para que a riqueza e o saber? Neste
questionamento desconcertante o autor revela a impotência humana, que sozinha,
não consegue encontrar um sentido para a sua vida. A princípio, o pessimismo do
texto pode parecer exagerado, todavia leva-nos a reconhecer a inutilidade do
materialismo, ao mesmo tempo em que nos ensina que só em Deus e com Deus
seremos capazes de encontrar o sentido da vida e preencher a nossa existência.
Na
segunda leitura (Cl 3,1-5.9-11) o Apóstolo Paulo continua sua catequese
com a comunidade de Colossas. Através da graça batismal, Paulo os convida a
crescer na identificação com Cristo. Para a comunidade dos Colossenses,
herdeiros da mentalidade grega, isso significava deixar de imitar os “deuses”
mitológicos cujas histórias apenas ensinavam práticas imorais e antiéticas. A
comunidade deveria então buscar renascer continuamente (converter-se e
abandonar as práticas mundanas), até ver manifestar em seus membros a
imagem do Homem Novo, Cristo ressuscitado que é “imagem de Deus”. Assim, no
final desta sua epístola, São Paulo mostra aos colossenses as exigências que
são necessárias para a vida nova. Ser batizado significa abandonar todas as
atitudes egoístas, como a ambição, o orgulho, a injustiça, a indecência, a
violência que leva a morte. Esta catequese do Apóstolo continua bastante atual.
Hoje, muitos são batizados e se dizem cristãos, mas se recusam a renunciar as
práticas que não condizem com o Evangelho. A comunhão com Cristo não é apenas
para a vida futura. Já somos nova criatura em Cristo, já somos pessoas marcadas
pela Ressurreição. Sendo assim, nossa vida cotidiana deve ser manifestação
desta verdade indelével.
No
Evangelho (Lc 12,13-21), ao receber um pedido para agir como juiz em um
conflito de irmãos por causa de herança, Jesus responde narrando a “parábola do
rico insensato”. Nela, ele denuncia o egoísmo de uma vida voltada apenas para
os bens materiais. Todavia, algo a mais na parábola deve nos chamar atenção. O
homem da parábola é um trabalhador; até onde se sabe suas posses não são fruto
de desonestidade ou roubo. Então por que Jesus o censura? Se prestarmos
atenção, os verbos e os pronomes empregados por ele (descansa, bebe, come,
aproveita, meus, tu, mim, etc.) manifestam uma pessoa centralizada em si
mesma; não pensa nos outros, somente em si mesmo. Para o Mestre, o homem que
age assim é um “louco”, pois esqueceu aquilo que, verdadeiramente, dá sentido à
existência. A pessoa que pede a Jesus para socorrê-lo na partilha dos bens
esqueceu que o maior bem a ser dividido e partilhado é a vida familiar e
comunitária. A Jesus é solicitado que convença o outro irmão a dividir a
herança, mas não solicitam que Jesus realize a reconciliação entre eles. Ao que
parece, não importava a ele estar em paz com o irmão, mas sim tomar para si a
herança em suas mãos.
Atualmente,
mais do que nunca vivemos uma sociedade marcada pelo individualismo,
subjetivismo, hedonismo e egocentrismo que colocam o bem estar individual como
valor absoluto. O sacrifício em prol de alguém, a renúncia que leva a socorrer
o outro estão cada vez mais cedendo lugar para uma falsa teologia que visa uma
vida totalmente sem sofrimento, onde a busca desenfreada pelo ter, pelo prazer
e pelo consumismo desvairado tornam-se o paraíso. As pessoas casam-se, todavia
não querem tornar-se famílias, pois não querem ter filhos. O que se busca é o
prazer pelo prazer, um consumismo devorador que promete um bem-estar eterno. Já
no século IV Santo Agostinho afirmava que o egoísmo origina a ganância que não
respeita nem Deus, nem o ser humano; não perdoa nem o pai nem o amigo, não
socorre nem a viúva e nem o órfão.
Tal
comportamento não condiz com nossa fé, pois o cristão verdadeiro deve assumir
os valores do Reino de Deus e ter a coragem de dar a vida pelas mesmas escolhas
que levaram Jesus a se entregar na cruz. A lógica do Reino é diferente da
lógica do mundo. Precisamos aprender que o maior tesouro é o ser humano em sua
dignidade (Cf: Ireneu de Lião – Contra as Heresias, IV, 20, 7). O
acúmulo de bens materiais sempre leva ao esquecimento do outro, inclusive de
Deus, da família e dos irmãos da comunidade.
Assim
como aconteceu com os dois irmãos que brigaram pela herança, a ambição, a
ganância e o egoísmo esvaziam o nosso coração, cegando-nos diante do essencial.
Deste modo, somos preenchidos pelos superficial e passageiro, caindo em um
consumismo que pode até nos tornar ricos de bens materiais, mas extremamente
pobres dos dons divinos, uma vez que nos rouba a liberdade e torna-nos escravos
da lógica do lucro que escraviza o outro e não nos faz verdadeiramente felizes.
E todo aquele que deseja ser dono do mundo se tornará incapaz de fazer parte do
Reino de Deus, reino que é partilha, comunhão e solidariedade.
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