sábado, 29 de fevereiro de 2020

REFLEXÃO LITÚRGICA DO 1º DOMINGO DA QUARESMA - CONVERTEI-VOS!




Dom Sergio da Rocha
Cardeal Arcebispo de Brasília

A
o receber as cinzas, no início desta Quaresma, nós acolhemos a Palavra de Jesus, repetida a cada ano pela Igreja, chamando-nos à conversão: “Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Esta Palavra continuará a ecoar ao longo deste tempo litúrgico, preparando-nos para a Páscoa. A atitude de conversão deve ser vivida através da oração, da penitência e da caridade. Por isso, a cor litúrgica roxa utilizada na Quaresma é sinal e recordação da penitência que não pode faltar no processo de conversão. O esforço de superação do pecado, sustentado pela graça de Deus, comporta sempre renúncias e sacrifícios.

Recordemos que a Quaresma é um tempo especial de perdão e de reconciliação. É necessário buscar o perdão de Deus através do Sacramento da Reconciliação e oferecer o perdão aos irmãos. É preciso viver reconciliados e chegar reconciliados à festa da Páscoa, para bem celebrar a ressurreição de Jesus. Nesta Eucaristia, com o Salmo 50, nós nos reconhecemos pecadores e suplicamos a misericórdia divina: “Piedade, ó Senhor, tende piedade, pois pecamos contra vós”.

O Evangelho proclamado nos fala das tentações de Jesus no deserto, conforme a narrativa de Mateus (Mt 4,1-11), fazendo-nos pensar nas tentações encontradas no mundo de hoje. O Evangelho nos transmite, acima de tudo, a certeza da vitória de Cristo e daqueles que, unidos a Cristo, lutam para vencer as tentações. Conforme o livro do Gênesis, o homem e a mulher caíram na tentação de não cumprir a Palavra de Deus, acarretando a condenação e a morte. Entretanto, por meio do homem novo, Jesus Cristo, que permaneceu na obediência ao Pai, nós recebemos “a justificação que dá a vida”, segundo a Carta de S. Paulo aos Romanos (Rm 5,19).

Na Quaresma, uma das principais expressões de vivência do amor fraterno é a Campanha da Fraternidade, promovida pela Igreja no Brasil. A Campanha da Fraternidade está intimamente associada à Quaresma, embora deva ser vivida além dela. Trata-se de um exercício intensivo de amor fraterno, que pode ajudar muito cada um de nós a fazer-se irmão e a reconhecer no outro um irmão a ser amado. Neste ano, o tema da Campanha é “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso”. A vida deve ser acolhida como dom precioso a ser valorizado e defendido em qualquer situação ou fase em que se encontre. Por isso, exige compromisso pessoal e comunitário. O belo lema proposto é inspirado na parábola do Bom Samaritano: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10,33-34).

Bom dia... 29/02/2020


sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Para viver o tempo da Quaresma

 
Dom João Justino de Medeiros Silva
Dom João Justino de Medeiros Silva
Arcebispo de Montes Claros

A
 Páscoa, celebração da morte e ressurreição de Jesus Cristo, é para os cristãos a mais importante festa litúrgica. Ela é antecedida pela Quaresma, que prepara as celebrações pascais. Este tempo, que se inicia na quarta-feira de cinzas, requer atitudes expressivas de disposição de viver segundo a Páscoa. Nesse sentido, viver a Quaresma é caminho para que a pessoa desenvolva um coração mais fraterno e livre. Ao longo da caminhada quaresmal, o cristão vai acolhendo a libertação oferecida por Cristo na cruz. Quem de nós não deseja viver de modo novo? “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gal 5,1).

Três atitudes caracterizam o caminho quaresmal, todas elas inspiradas no Evangelho: a esmola, a oração e o jejum (Mt 6,1-18). “Dar esmola” é criar espaço de liberdade consigo mesmo, é ser capaz de oferecer ao outro algo meu, exercitando a solidariedade e questionando o desejo de acumular. É mais do que depositar algumas moedinhas junto a alguém que pede pela calçada. Por sua vez, “orar” é colocar-se diante de Deus, reconhecendo a própria condição humana e depositando n’Ele toda a esperança. “Jejuar”, noutro vértice, é exercitar a liberdade interior em comunhão com os que têm fome e experimentar o vazio que o jejum traz. Vazio este que nos incomoda, faz pensar, e nos desafia a rever o estilo de vida que levamos.

Considerando os tempos de hoje e a vida movimentada da maioria de nossas cidades, há outros possíveis exercícios quaresmais. Por exemplo, silenciar-se. A cidade é o lugar da comunicação. Sons maravilhosos e ruídos se misturam. Raros são os momentos de silêncio. Ao silenciar-se, a pessoa abre espaço para a escuta mais profunda de si mesmo. Aí Deus fala. Que tal um dia de silêncio ao longo da quaresma?

Peregrinar. Ainda que a pessoa na cidade transite sempre de um lado para outro, a peregrinação é um desinstalar-se diferente. Não é o mesmo que caminhar para manter-se em forma, como tantos fazem todos os dias. É percorrer um caminho, com direção, deixando que o próprio caminho fale através do que é novo, das surpresas, do inusitado. Que tal organizar-se para uma pequena peregrinação – a pé! – a um Santuário ou Igreja de sua região?

Reconciliar-se. O perdão é uma expressão pascal. Celebrar a Ressureição de Cristo supõe estar reconciliado. A esmola, a oração e o jejum podem ajudar a perceber a necessidade de reconciliar-se consigo mesmo, com o outro, com Deus. Quem oferece o perdão encontra a paz! Por que não se confessar nesta Quaresma?

Visitar. O encontro com o outro ou com outras realidades sociais sensibiliza a pessoa. O coração humano se renova quando se permite tocar pelo outro. Um bom exercício é visitar um enfermo, um idoso que vive só, um projeto social. Nesses encontros pode-se oferecer, mas com certeza se recebe muito mais.

Estar em família. Exercício cada vez mais incomum nos dias de hoje. Que tal definir um tempo ao longo da Quaresma para uma refeição com a presença de todos, para uma conversa descontraída ou para um passeio em família… enfim, um momento que ajude a recuperar o encontro e o diálogo.

Outros exercícios poderão ser descobertos. Para serem quaresmais devem contar com o desejo e o empenho de acolher em seu coração Jesus Cristo, palavra viva do Pai, a verdade que liberta.

Bom dia... 28/02/2020


quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

REFLEXÃO LITÚRGICA DA SOLENIDADE DA QUARTA-FEIRA DE CINZAS




Pe. Francisco Cornélio Freire Rodrigues
Diocese de Mossoró-RN
Folheto litúrgico "Deus Conosco"

C
om a celebração desta QUARTA-FEIRA DE CINZAS, iniciamos a QUARESMA, tempo especial no qual somos chamados de modo intenso a trilhar um caminho de conversão, tendo em vista a necessidade de viver reconciliados com Deus e, assim não apenas celebrarmos, mas, sobretudo, gozarmos os dons pascais. Por sinal, conversão e reconciliação, as palavras-chave da espiritualidade quaresmal, são bem evidenciadas pela liturgia de hoje.

Através do profeta Joel, na Primeira Leitura, ouvimos o apelo do Senhor a nos voltarmos para Ele com todo o nosso ser, principalmente com um coração sincero, pois como são grandes a sua compaixão, bondade e misericórdia. Ele perdoa sempre aqueles que a Ele se voltam. Na mesma linha, a Segunda Leitura apresenta a exortação do apóstolo Paulo à reconciliação com Deus como uma oportunidade que não pode passar despercebida, pois é esse o tempo favorável e, por isso, a conversão não pode ser adiada, a oportunidade não pode ser desperdiçada.

E para alcançar a conversão e a reconciliação com Deus, a Igreja continua a indicar algumas práticas imprescindíveis, como a esmola, a oração e o jejum, costumes já praticados no judaísmo e aconselhados por Jesus, como indica o Evangelho de hoje, porém, numa nova perspectiva: que tudo seja feito para agradar a Deus, e não para ganhar a recompensa dos homens.

Para Jesus, o importante é a atitude interior de conversão a Deus. Os cristãos não podem agir buscando reconhecimento humano, nem se deixar levar pelas aparências.

O bem praticado não pode ter como fim a obtenção de méritos (reconhecimento) e aplausos, como pretendiam os fariseus. O cristão pratica jejum agradável a Deus quando renuncia ao egoísmo, ao ódio, à injustiça, enfim, quando age para tornar o mundo mais propício à vida em plenitude, promovendo a verdade, praticando a justiça, amando ao próximo e ajudando-o em suas necessidades.

Enfim, o jejum agradável a Deus é a luta pela construção de um mundo sem hipocrisia, sem injustiças e pleno de amor. E a Quaresma é o tempo favorável para refletirmos e nos reconduzirmos a esse caminho.

Bom dia... 26/02/2020


terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

QUARESMA, Tempo de Reflexão e Oração


A
 palavra “QUARESMA” vem do Latim quadragésima e é utilizada para designar o período de quarenta dias que antecedem a festa ápice do cristianismo: a Ressurreição de Jesus Cristo, comemorada no famoso Domingo de Páscoa. Esta prática data desde o século IV.

Na QUARESMA, que começa na QUARTA-FEIRA DE CINZAS e termina na quarta-feira da Semana Santa, os católicos realizam a preparação para a Páscoa. O período é reservado para a reflexão, à conversão espiritual. Ou seja, o católico deve se aproximar de Deus visando o crescimento espiritual. Os fiéis são convidados a fazerem uma comparação entre suas vidas e a mensagem cristã expressa nos Evangelhos. Esta comparação significa um recomeço, um renascimento para as questões espirituais e de crescimento pessoal.
                                            
O cristão deve intensificar a prática dos princípios essenciais de sua fé com o objetivo de ser uma pessoa melhor e proporcionar o bem para os demais. Essencialmente, o período é um retiro espiritual voltado à reflexão, onde os cristãos se recolhem em oração e penitência para preparar o espírito para a acolhida do Cristo Vivo, Ressuscitado no Domingo de Páscoa. Assim, retomando questões espirituais, simbolicamente o cristão está renascendo, como Cristo. Todas as religiões têm períodos voltados à reflexão, eles fazem parte da disciplina religiosa. Cada doutrina religiosa tem seu calendário específico para seguir.

A COR LITÚRGICA DESTE TEMPO É O ROXO, QUE SIGNIFICA LUTO E PENITÊNCIA
Cerca de duzentos anos após o nascimento de Cristo, os cristãos começaram a preparar a festa da Páscoa com três dias de oração, meditação e jejum. Por volta do ano 350 d.C., a Igreja aumentou o tempo de preparação para quarenta dias. Assim surgiu a Quaresma.

QUAL O SIGNIFICADO DESTES 40 DIAS?
Na Bíblia, o número quatro simboliza o universo material. Os zeros que o seguem significam o tempo de nossa vida na terra, suas provações e dificuldades. Portanto, a duração da Quaresma está baseada no símbolo deste número na Bíblia.

Nela, são relatadas as passagens dos quarenta dias do dilúvio, dos quarenta anos de peregrinação do povo judeu pelo deserto, dos quarenta dias de Moisés e de Elias na montanha, dos quarenta dias que Jesus passou no deserto antes de começar sua vida pública, dos 400 anos que durou a estada dos judeus no Egito, entre outras.

Esses períodos vêm sempre antes de fatos importantes e se relacionam com a necessidade de ir criando um clima adequado e dirigindo o coração para algo que vai acontecer.

O QUE OS CRISTÃOS DEVEM FAZER NO TEMPO DA QUARESMA?
A Igreja católica propõe, por meio do Evangelho proclamado na quarta-feira de cinzas, três grandes linhas de ação: a oração, a penitência e a caridade. Não somente durante a Quaresma, mas em todos os dias de sua vida, o cristão deve buscar o Reino de Deus, ou seja, lutar para que exista justiça, a paz e o amor em toda a humanidade.

Os cristãos devem então recolher-se para a reflexão para se aproximar de Deus. Esta busca inclui a oração, a penitência e a caridade, esta última como uma consequência da penitência.

COMO SE CALCULA A PÁSCOA? QUANDO VAI CAIR?
A Páscoa sempre acontece na primeira lua cheia após a primavera na Europa (outono aqui no Brasil). A primavera na Europa tem um enorme significado de vida, pois durante o inverno toda a natureza fica morta, ressurgindo com o início de uma nova estação. Podemos fazer uma analogia da primavera com a Ressurreição de Jesus, que vence a morte.

Bem, como estávamos falando, quando se descobre qual o dia da primeira lua cheia da primavera, então se passam a contar 40 dias (quaresma) para trás, sem incluir os domingos. Então se chega à data que será a Quarta-Feira de Cinzas e o início da quaresma. Por isso, a Páscoa é uma data móvel, assim como a Sexta-Feira Santa, a Quinta-Feira Santa, o Carnaval, etc.

Bom dia... 25/02/2020


sábado, 22 de fevereiro de 2020

Reflexão Litúrgica do 7º Domingo do Tempo Comum - SEDE SANTOS!


 
Dom Sergio da Rocha
Cardeal Arcebispo de Brasília

A
 Liturgia da Palavra se abre com o convite: “SEDE SANTOS, PORQUE EU, O SENHOR VOSSO DEUS, SOU SANTO(Lv 19,1) e se conclui com a Palavra de Jesus: “sede perfeitos como o vosso Pai Celeste é perfeito!” (Mt 5,48). As próprias leituras da missa nos ensinam como ser santos.

O livro do Levítico resume a vivência da santidade na expressão: “amarás o teu próximo como a ti mesmo!” (Lv 19,18), exortando-nos a não ter ódio, não guardar rancor, não procurar vingança e a corrigir os que erram. São Paulo afirma que nós somos “santuários de Deus”, recordando-nos que “o santuário de Deus é santo”, pois o Espírito de Deus mora em nós. Assim sendo, ele nos faz uma severa advertência: “se alguém destruir o santuário de Deus, Deus o destruirá” (1Cor 3,16-17).

No Evangelho, continuamos a meditar o chamado “Sermão da Montanha”, narrado por S. Mateus. Na passagem proclamada, Jesus nos mostra como amar o próximo, ampliando e tornando mais exigente o que até então se afirmava a respeito da Lei. O que diferencia a atitude dos seus discípulos da conduta dos que não o seguem? Os discípulos de Jesus não devem amar apenas aqueles que os amam ou saudar somente os próprios irmãos. Para amar como Jesus ama e como ele ensinou a amar, é preciso incluir no mandamento do amor ao próximo o que ele nos diz: “amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem” (Mt 5,44). É sabedoria de Deus, conforme São Paulo, muito diferente das “coisas deste mundo” (1Cor 3,18). É uma atitude espiritual que vai muito além dos sentimentos humanos e por isso tem a sua fonte e sustento em Deus.

Nós podemos viver deste modo, graças ao amor misericordioso do Senhor. Com o consolador Salmo 102, louvamos a Deus reconhecendo a sua bondade e compaixão. Ele perdoa as nossas culpas, “cerca de carinho e compaixão”, “é indulgente, é favorável, é paciente, é bondoso e compassivo”.

Na próxima semana, com a Quarta-feira de Cinzas, inicia-se a Quaresma, tempo especial de conversão rumo à Páscoa, a ser vivido através da oração, da penitência e da caridade. Como meio de vivência quaresmal, inicia-se em toda a Igreja no Brasil a Campanha da Fraternidade, que neste ano tem como tema Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso e como lema “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10,33-34). Procure viver bem a Quaresma! 

Lembre-se que a QUARTA-FEIRA DE CINZAS continua a ser dia de jejum e abstinência de carne. Participe da missa!

Carnaval, festa e religião!


Maria Clara Lucchetti Bingemer


É
 parte constitutiva da identidade do ser humano o elemento da festa.  A festa interrompe o tempo cotidiano e introduz a diferença do ritual e da celebração, a fim de marcar uma ocasião especial em que é preciso deixar a rotina e voltar os olhos para o extraordinário que irrompe no tempo cronológico.

Todas as festas são eventos pelos quais se entra em “outra” ordem de coisas, onde a fantasia, a imaginação e o desejo tomam lugar.  Festejar, portanto, é reafirmar nossa condição de ser humano, é sublinhar o fato de que não somos guiados apenas pelos instintos e pelo kronos que implacavelmente passa.  Festejar é demonstrar que temos algum senhorio sobre o tempo, transfigurando-o com o rito da comemoração e da celebração.

Em tempo de preparação e espera do carnaval, as reflexões acima se aplicariam a essa festa. Somos instigados a refletir sobre o sentido e o objetivo da música e da dança, dos espetáculos cheios de luzes e cofres, dos corpos desnudados e fantasiados em desfile, do samba na rua, de tudo isso que compõe os três dias que o povo espera com sofreguidão. Torna-se isto ainda mais importante no Brasil país onde o carnaval ocupa lugar central no imaginário do povo. Chamado com justeza país do Carnaval, o Brasil parece que entra em câmara lenta no Ano Novo para só recuperar seu ritmo e dinamismo depois dos festejos momescos.

Efetivamente, a maioria daqueles e daquelas que “brincam” o Carnaval conhecem pouco ou nada do seu sentido mais profundo. A primeira dimensão dos folguedos carnavalescos tem a ver com um tempo religioso, cósmico e sagrado, onde a Transcendência mesma é que irrompe e transfigura o kronos.  O antropólogo Roberto da Matta nos chama a atenção em seu conhecido livro “Carnavais, malandros e heróis” para o fato de que o carnaval fica suspenso entre o Advento (tempo ligado ao nascimento de Cristo que é celebrado no Natal) e os 40 dias da Quaresma, esse período de penitência e mortificação que visa a conversão (metanoia), o qual culmina com a  celebração dos mistérios da paixão,  morte e  ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo.

De fato, é como se todo o ritual carnavalesco, tão apaixonadamente preparado e vivido pelo povo e que tantos milhões rende aos bolsos dos donos das festas e desfiles só deixasse brilhar seu verdadeiro sentido quando o silêncio da Quarta-feira de Cinzas se faz, com seu ritual das cinzas aplicadas em cruz sobre a testa dos penitentes acompanhado das palavras: Convertei-vos e crede no Evangelho. A quarta feira onde tudo se acaba proclama sua morte, que se encontra, agora, assumida pela disciplina da Quaresma que substitui os folguedos e a descontração carnavalesca.

O carnaval, portanto, não tem rosto próprio, já que sua identidade lhe é dada por um outro tempo e uma outra ordem de coisas e de sentido. Figura ele – ainda seguindo a Roberto da Matta - como um momento sem nome ou vez, escondido que está nas dobras de um calendário sagrado. Situado entre o nascimento e a paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, a festa que é o reinado de Momo é efêmera como as alegrias e gozos imediatos.  Ela como que assume e resume simbolicamente os momentos crísticos do Natal e da Páscoa, e a numerologia cristã dos três dias de que fala o Novo Testamento. O carnaval em si mesmo, portanto, é um evento relativo.  Com todo o brilho e o ruído que atraem todos os focos de atenção, na verdade está simplesmente resumindo algo de fulgor bem maior e duradouro: os três dias de folia se referem e encontram significação no mistério cristão, já que a festa carnavalesca  nasce, agoniza e morre em três dias.

Sendo um evento sincrônico, repetitivo, prenhe de conteúdos cognitivos e afetivos, o Carnaval tornou-se e passou a ser um tempo social importante, fortemente ligado à experiência vital de uma sociedade, muito especialmente da sociedade brasileira.

Em uma leitura informada pela fé, porém, e mesmo aos olhos das Ciências Sociais, o Carnaval só pode ser compreendido no contexto da visão de mundo cristã. Carnaval e Quaresma – no calendário cristão que rege o mundo após a queda do Império Romano - opõem-se no ciclo anual por seus conteúdos sociais e religiosos implicando comportamentos individuais e coletivos opostos. Porém na verdade, encontram seu ponto luminoso e iluminador na mesma pessoa de Jesus Cristo, Sol que nunca se apaga, Vivente por excelência, sobre quem a efemeridade das coisas e a corrupção da morte não têm poder.

*Maria Clara Lucchetti Bingemer é Teóloga e professora do Departamento de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, é autora de vários livros como 'Um rosto para Deus' (Editora Paulus) e 'O mistério e o mundo – Paixão por Deus em tempo de descrença' (Editora Rocco).

Bom dia... 22/02/2020


sábado, 15 de fevereiro de 2020

Reflexão Litúrgica do 6º Domingo do Tempo Comum - O CAMINHO DA SABEDORIA E DA VIDA




Dom Sergio da Rocha
Cardeal Arcebispo de Brasília

S
egundo o Livro do Eclesiástico, o homem tem diante de si dois caminhos: o bem e o mal, a vida e a morte. Com a sabedoria de Deus, é chamado a escolher a vida, pois o Senhor “não mandou a ninguém agir como ímpio e a ninguém deu licença para pecar” (Eclo 15,19). São Paulo afirma que tal sabedoria “não é deste mundo”, mas vem de Deus. Ele anuncia a “sabedoria de Deus”, recordando-nos que aquilo que Deus preparou para nós vai muito além do que possamos ver, ouvir ou imaginar (1Cor 2,6-10).

O Evangelho nos mostra a sabedoria de Deus, Jesus Cristo, ensinando-nos a trilhar o caminho da vida. No “Sermão da Montanha”, narrado por Mateus, Jesus dá a nova Lei ao novo povo de Deus, assim como outrora Moisés subiu o monte Sinai para dar a Lei ao povo da Antiga Aliança. Contudo, logo no início do texto proclamado, Jesus esclarece que não veio para “abolir a Lei e os Profetas”, mas sim para dar-lhes pleno cumprimento (Mt 5,17).

Jesus ensina o verdadeiro sentido da Lei, que estava sendo esquecido, tornando-a muito mais exigente, conforme os quatro exemplos que são apresentados na passagem proclamada hoje: 1º) a respeito do homicídio, Jesus vai muito além do simplesmente “não matar”, excluindo qualquer tipo de dano ao irmão; 2º) sobre o adultério, ele ultrapassa a letra da lei advertindo sobre a raiz deste pecado, que está no coração do homem; 3º) quanto ao divórcio, Jesus recusa a prática então em vigor, recordando, numa outra passagem, que o Criador fez o homem e a mulher para se unirem numa só carne, não devendo o homem separar o que Deus uniu (cf. Mt 19,3-9); 4º) o último exemplo se refere aos juramentos; ao invés deles, Jesus afirma a importância da sinceridade e da verdade, ao propor que “seja o vosso sim: “Sim” e o vosso não: “Não”. Este modo mais exigente e fiel de compreender e viver a Lei deverá nortear a vida dos discípulos de Cristo, como caminho de vida e de verdadeira liberdade a ser trilhado pelo novo povo de Deus.

Em resposta à Palavra de Deus, seja sempre maior o nosso empenho em progredir na acolhida e vivência da sabedoria divina. Com o Salmo 118, nós reconhecemos que é “feliz o homem sem pecado em seu caminho, que na lei do Senhor Deus vai progredindo”! É feliz quem anda na nova Lei do Senhor! Por isso, procure ler e meditar, de modo especial, o Evangelho segundo Mateus, que está sendo proclamado nos Domingos do Tempo Comum, deste Ano Litúrgico, procurando discernir os passos que Deus espera de nós no caminho da sabedoria e da vida.

Grupo Mãos Dadas inicia o ano com o Projeto Reza do Terço em Família.




O
 GRUPO MÃOS DADAS, do MFC - Movimento Familiar Cristão de Maceió, Alagoas, iniciou neste ano de 2020 o projeto REZA DO SANTO TERÇO EM FAMÍLIA, visitando, rezando e pedindo bênçãos para as casas de amigos e familiares, não mfcistas e/ou mfcistas afastados, oportunidade que participam os membros do Grupo, familiares e amigos da casa visitada.

O Grupo Mãos Dadas entende que a reza do Terço não é uma devoção, mas uma oração missionária que compromete o Grupo com a missão e faz a aproximação com os irmãos e irmãs, caminhando com eles, sentindo e participando dos problemas e das alegrias.

Terço na residência de dona Bezinha
O primeiro Terço em Família foi rezado na residência de Dona Bezinha Maciel, mãe do mfcista Jorge de Penha. O segundo Terço foi rezado na residência do casal Robson e Rose, mfcistas que estão temporariamente afastados das atividades do MFC.

Terço na residência de Robson e Rose
Rezar o Terço é encontrar-se com Maria, para que Ela nos leve até Jesus, na certeza de sua intercessão e proteção. A reza do Terço faz com que as dificuldades que aparecem em nossas vidas, caiam por terra. Rezar a Deus junto com Maria é uma graça que não podemos desprezar.

O projeto REZA DO TERÇO EM FAMÍLIA terá continuidade por todo o ano de 2020 e aqueles que desejarem que o Grupo vá à sua casa, deve manter contato com um dos membros do Grupo Mãos Dadas e agendar a data.

Bom dia... 15/02/2020


sábado, 8 de fevereiro de 2020

Reflexão Litúrgica do 5º Domingo do Tempo Comum - SAL DA TERRA E LUZ DO MUNDO




Dom Sergio da Rocha
Cardeal Arcebispo de Brasília

P
ara falar da presença dos seus discípulos no mundo, Jesus recorre às sugestivas imagens do sal e da luz, cuja importância era bastante conhecida pelas pessoas que o ouviam. O sal, apreciado por dar sabor e preservar os alimentos, e a luz, por iluminar a casa ou o caminho durante a noite e por aquecer no frio.

A presença do sal nos alimentos ou da luz na escuridão é percebida facilmente, porém, não de modo ostensivo. O sal não se mostra como tal nos alimentos, sendo sentido apenas o seu sabor. A luz se espalha pelos ambientes. A presença discreta, mas facilmente perceptível, do sal e da luz expressa como o cristão deve agir no mundo: com vigor e humildade, com o testemunho corajoso e a simplicidade de vida.

O testemunho de São Paulo, recordado na segunda leitura, é um precioso exemplo disso ao afirmar que o anúncio do Evangelho não depende da “linguagem elevada ou do prestígio da sabedoria humana” (1Cor 2,1). A força e a sabedoria de Deus são manifestadas muitas vezes na pequenez e na fragilidade experimentada pelos discípulos de Cristo, como “demonstração do poder do Espírito”. Não é por si mesmos, mas pela graça de Deus, que os discípulos se tornam “sal da terra” e “luz do mundo”. Eles recebem de Deus o sabor que dá sentido à vida e a luz para iluminar o mundo. Eles podem ser luz somente na medida em que são iluminados; apenas podem dar sabor, na medida em que o receberem de Cristo. Esta perspectiva se expressa também nas palavras conclusivas do Evangelho proclamado: “para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus” (Mt 5,16), afirma Jesus. O testemunho cristão deve levar a glorificar a Deus e não ser motivo de vaidade.

O profeta Isaías anuncia as condições para que a “luz” possa brilhar “como a aurora” ou como “o meio dia”: a vivência da caridade e da misericórdia para com os famintos, os pobres e os peregrinos; a superação da violência e da maldade. O Salmo 111, hoje meditado, afirma que é “feliz o homem caridoso e prestativo” e que “o bem praticado pelo justo permanece para sempre”.

Sal e luz não são apenas para dias de festa, mas também na vida cotidiana, a começar da própria casa, assim como, a luz “ilumina os que estão na casa”. Apesar das muitas dificuldades para a vivência cristã em família, sentida por tantas pessoas, ninguém está dispensado de fazer o máximo possível. A chama da fé em Cristo, simbolizada pela vela recebida no Batismo, possa brilhar em casa, no trabalho, na escola e em toda parte, alimentada sempre mais pela oração, pela Palavra e pela Eucaristia.

Bom dia... 08/02/2020


sábado, 1 de fevereiro de 2020

Reflexão Litúrgica da APRESENTAÇÃO DO SENHOR - LOUVOR E ALEGRIA



Dom Sergio da Rocha
Cardeal Arcebispo de Brasília

n
este domingo, em toda a Igreja, celebramos a Apresentação do Senhor, uma das festas litúrgicas mais antigas, celebrada em Jerusalém já no século IV.  A importância do tema da “luz”, com a benção das velas, tornou-a conhecida como festa de Nossa Senhora das Candeias, da Candelária ou da Luz. O menino Jesus, apresentado no templo de Jerusalém por Maria e José, foi reconhecido por Simeão, que o tomou nos braços, como “luz para iluminar as nações” (Lc 2,32). O louvor e a alegria de Simeão se prolongam na Igreja que continua a proclamar que Jesus é a luz para todas as nações. Também Ana, profetisa de idade avançada, “pôs-se a louvar a Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém” (Lc 2,38). Nós repetimos o gesto de Simeão e Ana, contemplando com o olhar da fé aquele que vem para salvar a todos os povos e acolhendo-o como a luz do mundo.

Estamos encerrando o Ano Jubilar, neste domingo. O Ano Jubilar motivou-nos a renovar o empenho para anunciar a boa nova a todos, especialmente aos que mais sofrem, com novo ardor missionário, confiando sempre no “amor de Cristo que nos impele”, conforme o lema jubilar. A oração continue a ser valorizado, em nossa Igreja, em ação de graças, memória, esperança e compromisso. Por tudo, nós damos graças!