segunda-feira, 30 de junho de 2014

MUDANÇAS NAS RELAÇÕES INTRAFAMILIARES


Helio Amorim
MFC/RJ

A sociedade humana evolui e se transforma com velocidade crescente em sua cultura, costumes, comportamentos e visão de mundo. No passado, bem menos de um século, não era assim. Os mais velhos eram ouvidos pelos mais jovens, respeitados por sua experiência de vida. Transmitiam aos que chegavam ao cenário da vida adulta os valores humanos, familiares, sociais e religiosos tradicionais, considerados imutáveis. As relações de jovens e adolescentes com seus pais e avós eram de curiosidade e aprendizagem, as influências externas ativas, mas limitadas. As crianças e os jovens pediam a bênção aos seus pais.

O
 rádio, ruidoso e às vezes mudo, já representava uma primeira ruptura nesse universo restrito de relações internas nas famílias. Era o mundo chegando às nossas casas, por via eletrônica insipiente, sem passar pelo crivo da escola ou das igrejas. O cinema já progredia e mostrava o mundo antes distante. Durante a Segunda Guerra as famílias já acompanhavam os horrores vividos no velho mundo, colorindo mapas com as notícias dos avanços nazistas e depois do dia-D a invasão aliada até a rendição.

A partir desse momento histórico de restauração da paz num cenário de destruição e mortes, os avanços tecnológicos acelerados para atender às demandas militares foram reorientados para a paz no pós-guerra. As casas foram invadidas pela televisão que ampliou o alcance do rádio e do cinema como formadores de nova cultura nas relações familiares. As ciências humanas dispararam, abalaram valores tradicionais e romperam os limites das crenças e dos catecismos.

A tensão cresceu nas relações dos mais velhos com os jovens nascidos nesse novo cenário de quebra de paradigmas culturais e religiosos que a partir de então foi se agudizando até rupturas irreversíveis.

O diálogo entre gerações ficou mais complexo, com seguidos conflitos e acordos, aos poucos redesenhando novos modelos de relações familiares. As Igrejas foram também desafiadas a rever suas doutrinas sobre a família, para acolher e responder aos desafios da modernidade questionadora.

Essa constatação das profundas mudanças na sociedade moderna ativadas pelos avanços científicos e tecnológicos deveria induzir a mais humildade dos formuladores das doutrinas e pastorais, com maior abertura à novidade que surge dos estudos dos teólogos e as interpelações dos cristãos leigos adultos que as questionam. É desses confrontos fraternos e construtivos que lentamente emerge a verdade, purifica-se a doutrina, humaniza-se a Igreja.

UM SÍNODO SOBRE A FAMÍLIA
A postura repressora do passado ainda se abate sobre teólogos e leigos que contestam questões mal resolvidas na vida da Igreja, interferindo nas relações familiares. Mas começam a ser reavaliadas pelo povo de Deus, provocado saudavelmente por uma consulta inédita do papa Francisco aos leigos de todo o mundo, na preparação do sínodo dos bispos sobre a família, neste ano.

Na pauta, dentre outras questões, o celibato forçado dos sacerdotes, o impedimento do casamento religioso e à participação na Eucaristia de divorciados que voltam a se casar, o reconhecimento da sacramentalidade da sua união, as uniões homoafetivas, com adoção de filhos, e outras questões antes fechadas, sequer admitindo discussões, não obstante a inconsistência das bases teológicas que as sustentavam.

Estamos assim, no patamar de novos tempos nas relações intrafamiliares e sociais, abertos ao muito que seguirá mudando nos próximos anos e décadas, permitindo-nos relativizar as "certezas" que hoje ainda se impõem. É claro que tudo o que se refere ao amor e à justiça, à humanização e à esperança cristã, à caridade e à solidariedade humana, permanecerá como essência da mensagem evangélica nas relações humanas, intrafamiliares e sociais.

O resto é dinâmico e evolutivo, criações humanas sob influxo da cultura, entendimentos provisórios, sujeitos a revisões em vista do avanço das ciências e da reflexão teológica que nenhum autoritarismo impedirá.


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