Dom Walmor Oliveira de Azevedo |
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo
Metropolitano de Belo Horizonte
“A
liberdade, portanto, não pode se transformar em arma, usada irresponsavelmente
para desferir golpes contra os outros.”
A
|
contemporaneidade exige
um aprendizado a respeito de como valer-se das conquistas alcançadas ao longo
da história para se construir um mundo melhor. Há uma ciência própria que deve
auxiliar o exercício da liberdade para que prevaleça também o respeito inegociável
aos direitos e às autonomias. Deve-se considerar sempre a ética da alteridade,
que exige uma específica competência cidadã. Somente assim é possível ver a
vida e avaliar cenários não apenas a partir do próprio lugar e de interesses
particulares, mas considerando perspectivas capazes de contemplar o bem maior,
da coletividade.
Sem esse discernimento interpretativo, continuará a prevalecer o
risco de autoritarismos e imposições que provocam desastres fatais e atingem
não apenas contextos específicos, mas toda humanidade. Por isso mesmo, o ponto
de partida será sempre uma vívida responsabilidade quanto àquilo que se fala,
os juízos emitidos sobre o outro, a respeito de culturas e de confissões
religiosas. A
liberdade individual e também a de imprensa não dão a ninguém o direito de
posicionamentos que ultrapassem o limite delineado pelo respeito a identidades
e diferenças.
O uso abusivo da liberdade de expressão, sem medir as
consequências, não raramente gera outros absurdos. Equívocos provocados por uma
sucessão de irracionalidades. A liberdade não pode ser compreendida como perda
do sentido de alteridade. Sempre deve haver respeito ao outro, às culturas e às
confissões religiosas. Merece atenção específica o contexto digital e
midiático, que tem papel decisivo na definição de comportamentos e escolhas,
influencia a formação de juízos a partir da disseminação de todo o tipo de
opinião. Muitos, de modo covarde, valem-se do anonimato possível na internet
para perpetrar uma sentença algoz até contra quem não merece.
A perda de parâmetros é um perigo e produz desastres que dividem
a opinião pública, criando os chamados “lados opostos”. Assim, inviabiliza a
abertura de uma nova e indispensável perspectiva que favorece diálogos
construtivos. A
liberdade, portanto, não pode se transformar em arma, usada irresponsavelmente
para desferir golpes contra os outros. Utilizá-la desse modo é provocar reações
também arbitrárias que geram cenários de perdas irreversíveis. A conduta
irresponsável de simplesmente dizer o que se quer e bem entende não é caminho
para se construir a sociedade do diálogo. Ora, é preciso ponderar antes de
emitir opiniões. Trata-se de exercer o princípio ético, particularmente porque
se sabe que a palavra tem força construtiva e demolidora.
O mundo não é um pequeno espaço, um “canto”, e, por isso,
ninguém deve se posicionar sem a devida consideração da pluralidade existente
entre povos, culturas e grupos. A “palavra dita” e a “palavra dada” precisam
ser balizadas pelo princípio ético. A globalização das informações, o direito
de juízos e o uso de liberdades não permitem desconsiderar o respeito moral e
cidadão ao outro. Portanto, é uma irresponsabilidade falar sem pensar e sem as
indispensáveis ponderações. É um grave equívoco desprezar a avaliação daquilo
que se diz pelos meios digitais, pela mídia, nas rodas de conversas, nas
reuniões, nos parlamentos, onde for. Esse erro é cometido, muitas vezes, por
governantes, empresários, líderes diversos e, também, pelo cidadão mais
simples.
Torna-se urgente mobilizar sensibilidades para se aprender, ou
reaprender, que é indispensável refletir, antes de dizer. Caso contrário, a
palavra não será veículo do diálogo, mas arma que provoca arbitrariedades e
gera a violência. O exercício de ponderação exige que a palavra a ser dita seja
planejada no silêncio que está em falta em nossa sociedade, muito inquieta e
barulhenta. A geração qualificada da palavra tem tudo a ver com a fonte da
ética que forja moralidades necessárias a decisões, posturas e escolhas. A
ética em defasagem produz a permissividade doentia que alimenta a corrupção,
seduz mentes e corações pelo afã do dinheiro e cega muitos no exercício do
poder.
É hora de investir, em todo lugar e de formas variadas, como
prioridade, na compreensão de que liberdade e respeito são indissociáveis. Isto
significa reconhecer a grande pluralidade que caracteriza o mundo, uma urgência
cultural e ética. Sem boa articulação entre liberdade e respeito, a sociedade
contemporânea, mesmo com seus avanços, vai sofrer com os ataques e vandalismos,
continuará a pagar altos preços.
*Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia
Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma, Itália) e mestre em
Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico (Roma, Itália).
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