sábado, 19 de outubro de 2024

Reflexão Litúrgica para o 29º Domingo do Tempo Comum - 20/10/2024

Pe. Paulo Sérgio Silva

Diocese de Crato – CE.

A

 liturgia deste 29º Domingo do Tempo Comum, continuando a catequese que visa formar os discípulos nos valores do Reino de Deus, reafirma que o serviço e a doação de si mesmo são a essência da missão de Jesus e que por isto são também exigências e urgências indispensáveis para os cristãos de todos os tempos.

Na primeira leitura (Is. 53,10-11), o profeta Isaías apresenta, ao povo escravizado no exílio, um misterioso “Servo de Deus”. Trata-se de alguém considerado insignificante e rejeitado, mas cuja vida e sofrimento revelam-se como a salvação de Deus. Aqui não se trata de fazer apologia ao sofrimento em si. Mas sim nos fazer entender que sofrer pelos outros, carregando seus aflições e angústias, é exemplo de serviço e doação, como percebemos na própria vida de Jesus. Dirá, São Paulo, séculos depois: “o que, porém, para o mundo é loucura, Deus o escolheu para envergonhar os sábios; e o que para o mundo é fraqueza, Deus o escolheu para envergonhar o que é forte.” (1Cor. 1,27) Por isto, este “Servo” se tornou o anúncio da vida e a missão de Cristo.

Na segunda leitura (Hb. 4,14-16), a Carta aos Hebreus fala-nos de um Deus íntimo a humanidade e que, por isso, rebaixa-se partilhando nossa frágil condição para nos fazer participar da sua condição divina. Dirá são Paulo: “Jesus Cristo, sendo rico, se fez pobre por vós, a fim de vos enriquecer por sua pobreza” (2Cor. 8, 9). Ele não ostenta seu poder e sua omnipotência, pelo contrário, tendo assumido a condição humana em plenitude, passou pelo sofrimento e pela morte, tornando-se a expressão de serviço, doação, misericórdia e compaixão. Mediante a sua vida, Jesus Cristo, que é ao mesmo tempo Sacerdote, Altar e Cordeiro sacrifical, constitui os seus discípulos, a comunidade cristã de todas as eras, em um Povo Sacerdotal enquanto permanece nos convidando a fazer da própria vida, analogamente a sua, um contínuo sacrifício de louvor, de entrega e de amor.

No Evangelho (Mc. 10,35-45), continuamos a percorrer, com Jesus e os discípulos, o caminho em direção a Jerusalém. João e Tiago reivindicam para si um privilégio que desperta a raiva dos demais discípulos porque provavelmente estes queriam pedir a mesma regalia. Todos os discípulos demonstram que ainda não compreenderam o coração do Mestre, não aceitam um Messias sofredor e alimentam uma visão imperialista do Reino de Deus com expectativas de um Messias glorioso, violento e autoritário. Jesus os convida a não usar o Reino de Deus como objeto para alcançar seus sonhos e planos pessoais de ambição, de grandeza, de poder e dominação, mas a converter suas vidas em serviço e doação de amor. Ao mencionar o batismo como início da missão, e o cálice como símbolo da paixão/conclusão da missão, Ele nos faz compreender que para permanecer com o messias glorioso na ressurreição é necessário acompanhá-lo em todos os momentos de sua missão, inclusive na doação da própria vida na Cruz.

O desejo de grandeza gera ambição, causa rivalidade e divisão da comunidade. Quando colocamos nossos projetos pessoais acima dos planos de Deus, a unidade deixa de existir. Em um mundo cada vez mais contaminado por uma falsa teologia da prosperidade, os cristãos precisam reaprender que a decisão de acolher o discipulado de Jesus e assumir suas consequências não pode depender de promessas de recompensas. Os lugares na glória futura são um dom gratuito de Deus Pai e não fruto da conquista pessoal.

Embora reprovemos, automática e veementemente, as atitudes de João, Tiago e dos demais discípulos neste episódio, esquecemos quão semelhantes são as nossas próprias condutas.  Isto porque facilmente esquecemos que para o Reino em nada frutifica as nossas vãs e risíveis guerras pelo poder ou pelo protagonismo, a nossa insaciável sede por honras e títulos, as nossas ambições mesquinhas que nos levam a querer impor nossa mediocridade sobre os outros.

O modelo de vida a ser seguida será sempre a do próprio Jesus Cristo. Nele, com Ele e por Ele nasce uma comunidade de “irmãos/servos”, não um império de generais e reis. Somos convidados a repensar a forma como vivemos diante da família, na escola, no trabalho e na sociedade como um todo. É preciso vigiar e orar para não transformarmos nossa missão em uma corrida onde usamos o Evangelho para alcançar poder e domínio sobre aqueles a quem nós devemos servir. É no amor e na entrega de quem serve humildemente aos irmãos que Deus oferece a vida eterna e verdadeira.  Somos discípulos de Jesus Cristo e, portanto, testemunhas e semente de um novo mundo “onde habitará a justiça.” (2Pd. 3,13)

 

Fonte: Site da Diocese de Crato - Ceará


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