Um dos ritos
presentes em todas as religiões é o rito de partida, despedida, ou como
costumamos dizer, o funeral de um ente querido. Em todo o sentido, o fato da
morte de uma pessoa, está relacionado e presente na vida de cada Comunidade.
Padre Guanair da Silva Santos
sacerdote em sua missão especial (consagração),
é confiada a “tarefa de manter intata e regular a relação com a divindade ou
com as forças celestes, mediante culto sacrifical organizado e normalizado com
regras fixas (ritos)” (BLANK, J.: 1993).
Daí que, “os
ritos e orações que a Igreja previu por ocasião da morte de um cristão não
podem ser vistos como simples prova de sentimento humanitário. Mas se em todas
as culturas os funerais tiveram um valor e um significado religioso, muito mais
no cristianismo, para o qual todo o autenticamente humano é susceptível de
adquirir sentido sagrado” (LLOPIS, J: 1988).
A
finalidade desta matéria é levar o leitor a perceber a importância e valor da
celebração das exéquias eclesiásticas, na vivência de sua catolicidade. Por
assim dizer, foi que o Concilio Vaticano II manifestou o desejo de que o “o
rito das exéquias deve exprimir mais claramente o sentido pascal da morte
cristã e responder melhor às circunstâncias de cada país” (SC,81).
Entendemos que, o funeral está, em intima comunhão com o mistério pascal de
Cristo, mistério pascal de Cristo, “o grande Kairós, o momento propício no
qual Deus se aproxima do homem, chamando-o à salvação” (TABORDA, F.:
2019). Então, todo sacramento celebra o fato, importante, da vida do
cristão e da comunidade em sua referência ao mistério pascal. Neste sentido, “os
sacramentos estão ordenados para santificação dos homens, para a edificação do
Corpo de Cristo e, em última análise, para prestar culto a Deus; mas, enquanto
sinais, têm também um fim pedagógico. Não só supõem a fé, mas, ao mesmo tempo,
alimentam-na, robustecem-na e exprimem-na por meio de palavras e coisas; por
esta razão chamam-se sacramentos da fé” (SILVA e SOUSA: 2004).
Assim
sendo, o sacramento do batismo e eucaristia, pelo que significam, a vida nova
em Cristo, confere nossa participação no mistério pascal, portanto “a
centralidade dos dois sacramentos maiores é ainda corroborada por serem ambos
constitutivos do ser cristão e edificadores da Igreja enquanto tal” (TABORDA,
F.: 2019).
Prescrutando
o Catecismo da Igreja Católica que também acentua esta centralidade dos dois
sacramentos, compreendemos que: “foi na sua Páscoa que Cristo abriu a todos
os homens as fontes do Batismo. O Batismo, cujo sinal original e pleno é
a imersão, significa eficazmente a descida ao túmulo, por parte do cristão que
morre para o pecado com Cristo, com vista a uma vida nova. Fomos sepultados com
Ele, pelo Batismo, na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos
mortos, pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova” (Rm 6,4)
(Catecismo 625). De certo o Catecismo da Igreja proclama que “as
exéquias eclesiásticas são uma celebração litúrgica da Igreja. A Igreja honra
nas exéquias o corpo do defunto por razões de fé: o corpo do cristão é templo
do Espírito Santo (1Cor 6,19-20) e está chamado à ressurreição
gloriosa” (POUILLY, A.: 1993).
Antes,
porém, de seguirmos nossa reflexão, permita-me apresentar uma preciosa
informação dada pelo professor e doutor em Liturgia Pe. Gregório Lutz ssp, de
saudosa memória, onde diz: O costume de celebrar a Eucaristia durante o
funeral ou em presença do defunto não é tão antigo como o da missa no 3º, 7º,
30º dias e no aniversário da morte. Não conhecemos nenhum documento anterior ao
sétimo século que ateste a celebração da missa nas exéquias. Parece que este
costume se iniciou no enterro de monges e religiosos. No VI século foi iniciado
o costume de celebrar missas pelos defuntos independentemente dos dias
mencionados. Da época de Gregório Magno, por volta de 600 d.C., sabemos que um
sacerdote celebrava, durante vários dias seguidos, missas para um determinado
defunto. A reforma litúrgica do Concílio Vaticano II aboliu as missas pelos
defuntos no 3º, 7º e 30º dias. (LUTZ, G. 2003).
Segundo a
legislação canônica (CIC 1177 §1;2;3) o lugar adequado dos funerais é a
paróquia do defunto, também quando ele tiver falecido em outro lugar. Foi na
comunidade paroquial que ele recebeu o sacramento do batismo e eucaristia e ali
cresceu e desenvolveu sua vida cristã. Aqui, e sem querer forçar a barra, como
alguns poderão pensar, cabe ao pároco a presidência das exéquias. Todo fiel,
por si mesmo ou por sus representantes, pode escolher o lugar da celebração das
exéquias. A escolha há-de ser pessoal ou pelos representantes do defunto e
expressa de modo que possa ser acreditada. Esta eleição deve ser livre, não de
forma coacionada, segundo afirma Manuel Fernando Sousa e Silva, em Direito
Sacramental I. Assim sendo, imaginamos que, todos os que participam com certa
frequência da celebração de missas em Comunidades e Paróquias estão conscientes
de que o tema principal das leituras e orações das missas pelos mortos no novo
missal é a Páscoa, a passagem desta vida para a outra, passagem esta que Jesus
Cristo realizou como “primogênito dos mortos” (Cl 1,18). Neste
caso o cristão não vive sozinho, o cristão não morre sozinho, mas o faz cercado
pela comunidade de crentes, família, Igreja a qual, foi acolhido no dia de seu
batismo. E assim, incorporados a Cristo pelo batismo, como nos ensina o
Apostolo Paulo, nós fomos sepultados com ele na morte para que, como Cristo foi
ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim nós vivamos vida nova (Rm
6,2-4). Neste sentido, a missa exequial torna-se evidentemente um ato
eclesial e requer de nossa parte, ministros ordenados por ser um direito dos
fiéis e uma obrigação da Igreja. Todavia, “este direito radica na condição de
comunhão do fiel, isto é, direito a participar na vida e auxílios do Povo de
Deus, mormente dos seus tesouros da Palavra de Deus, dos Sacramentos e, neste
caso, dos sufrágios da Igreja” (SILVA e SOUSA:2004).
O Deus de
Jesus Cristo não faz acepção de pessoas. A celebração da missa, o mistério
pascal, é simultaneamente “fonte e cume de toda atividade da Igreja” (SC
10). Tendo em conta as normas litúrgicas do Vaticano II, as leis canônicas,
bem como a Nova Instrução Geral ao Missal Romano, aqui faço um destaque
específico entre os números 379-385, encontramos as normas para Missa pelos
fiéis defuntos que assim descreve: entre as missas dos fiéis defuntos
ocupa o primeiro lugar a missa de exéquias, que pode ser celebrada todos os
dias, exceto nas solenidades de preceito, na Quinta-feira da Semana Santa, no
Tríduo Pascal e nos Domingos do Advento, da Quaresma e da Páscoa, observando,
além disso, tudo o que é de direito (380). Além, disso, os pastores levem
especialmente em conta aqueles que por ocasião das exéquias comparecem às
celebrações litúrgicas e escutem o Evangelho, tanto os não católicos como
católicos que nunca ou raramente participam da Eucaristia, ou parecem ter
perdido a fé, pois os sacerdotes são ministros do Evangelho de Cristo para
todos (385).
Diante do
exposto, surge para nós uma questão de cunho pastoral. Delicada em si. Que
exige de cada ministro ordenado, principalmente neste tempo de pandemia
vigente, uma atenção toda especial, que é a missa exequial, ou dos defuntos ou
ainda de corpo presente. Fixando nosso olhar para a Cruz de Cristo, ele que nos
amou em primeiro e consagrados a seu serviço, como temos dado atenção, a dor,
ao sofrimento das famílias que nos pedem rezar a missa de corpo presente? Em
nossa Igreja Particular, na nossa paróquia a missa exequial tem tido um lugar
especial em nossa ação pastoral? Temos consciência de que as missas pelos
defuntos como previsto pelo Magistério da Igreja é, um direito de todos os
fiéis? E, não somente para alguns escolhidos e preferidos do sacerdote?
Deixamos nossas atividades burocráticas/administrativas para ir ao encontro
destas famílias, em luto? Fato marcante, foi o testemunho que o Papa Francisco
nos deu, diante da morte do Cardeal Vicentino Agostino Cacciavillan, suas
exéquias foram celebradas pelo cardeal decano Giovanni Battista Re e ao final
da missa, o Papa Francisco presidiu o rito da Última Commendatio e Valedictio,
deixando assim, de estar retirado em oração mais intima com Deus nos exercícios
espirituais, onde unido a oração de toda a Igreja, reza pela família humana,
paz no mundo, o conforto e consolação de Deus aos perseguidos, abandonados,
migrantes e falecidos, para estar ali presente, o Pastor que conduz a ovelha a
morada eterna (Sl 23 (22)).
PADRE GUANAIR DA SILVA SANTOS é Pároco da
Paróquia São Vicente de Paulo, em Coronel Pacheco/MG e Mestre em Liturgia.